“E é sempre pela crucificação e morte na cruz da renúncia daquele velho Adão, o ser inferior, e a ressurreição e ascensão para uma condição de perfeição verdadeira que a salvação é finalmente alcançada. E a razão pela qual todas essas verdades eternas na história da alma foram centralmente colocadas na vida do profeta de Nazaré é simplesmente porque, reconhecendo nele os sinais ou testemunho de sua realização de perfeição num grau nunca antes alcançado, e em sua história as adequadas correspondências simbólicas, o Espírito Divino, sob cuja inspiração os Evangelhos foram compostos, o selecionou como o ícone das possibilidades da humanidade em geral.
Porém, mesmo rejeitando dessa maneira como sendo idólatra, como uma blasfêmia, e como perniciosa no mais alto grau à doutrina, conforme ela é comumente conhecida, da Redenção, Reconciliação ou Salvação Vicária [N.T.: Aquela realizada por alguém em lugar de outro; no caso o sacrifício de Jesus Cristo para nos redimir do pecado, para nos reconciliar com Deus], ainda assim vemos em Cristo Jesus o “único Filho gerado por Deus” (“Filho único de Deus”) (João 3:16, 18). E ainda assim nos apegamos a Seu sangue e a sua cruz como os únicos meios da salvação.
Mas é o Cristo Jesus dentro de nós, ou o homem que renasceu de alma e espírito puros, como o próprio Jesus declarou que todos devem nascer – exatamente do mesmo modo como se descreve que Ele nasceu – a quem buscamos para nos salvar. E os meios são Sua cruz de autossacrifício, renúncia, e pureza de vida; e a recepção em nós mesmos daquele “Sangue de Deus” que não é nenhum sangue meramente físico – com o qual as imperfeições morais não possuem nenhuma relação – mas que é a vida de Deus, o próprio Espírito puro, o qual é Deus, e o qual Deus está sempre derramando em abundância para o bem de Suas criaturas, dando a elas de sua própria vida e substância.
Quão perniciosa é a doutrina da redenção (ou reconciliação) vicária, conforme ela é comumente aceita, é algo que pode ser visto pelas atuais condições do mundo: intelectualmente, moralmente e espiritualmente, não menos do que fisicamente.
O homem sempre se constrói segundo a imagem de seu Deus, isto é, segundo a sua ideia de Deus. E acreditando em um Deus que é injusto, egoísta e cruel, o homem não pode ser senão injusto, egoísta e cruel.
É precisamente essa má representação do caráter divino, e essa perversão da verdadeira e da única possível doutrina da reconciliação ou redenção, em uma doutrina que faz a salvação do homem um processo externo a si mesmo, e dependente da ação de outro que não ele mesmo, que, por meio da falsificação do Cristianismo, provocou o seu fracasso. E, ao invés de um mundo ordenado por princípios de justiça, simpatia e pureza, nos legou um mundo de más ações, de egoísmo e de sensualismo”. [Anna Kingsford e Edward Maitland. Addresses and Essays on Vegetarianism (Palestras e Ensaios sobre o Vegetarianismo), capítulo O Vegetarianismo e a Bíblia, pp. 222-223; grifos nossos].