Bíblia, Coleção de Parábolas Sobre a História da Alma: Pessoas, Povos, Animais etc, são Símbolos – Materializar os Símbolos é Cometer Idolatria

A Bíblia, em síntese, pode ser definida como uma coleção de parábolas narrando a história da Alma, desde sua primeira descida na matéria, até o seu retorno final para sua condição original de puro espírito. E como a Alma passa pelo mesmo processo quer se trate de uma só ou de muitas – seja uma pessoa, uma igreja, uma raça, ou mesmo o universo como um todo – a narrativa que descreve, ou a parábola que representa a história de um, igualmente o faz para todos. E os mesmos termos, que são três em número, abrangem todo o processo.

Esses termos são Geração, Degeneração e Regeneração, e esses, portanto, sendo aplicados à Alma, são o tema da Bíblia, conforme agora mostraremos, e não a história física, ou qualquer pessoa ou povo seja lá qual for, muito embora sejam descritos em termos derivados de pessoas ou de um povo. E tomar tais pessoas, povos ou um outro símbolo por qualquer outra coisa que não sejam os seus apropriados papéis de símbolos, e ignorando o seu verdadeiro significado, e dar-lhes a honra devida apenas àquilo que de fato eles significam trata-se, em linguagem bíblica, de cometer idolatria.

Pois, ao assim proceder, nós materializamos mistérios espirituais, e conferimos à Forma a consideração devida apenas à Substância. Onde quer que compreendamos como coisas Sensoriais coisas que tão somente pertencem ao Espírito, encobrindo assim as verdadeiras feições da Divindade com representações falsas e espúrias, nós cometemos o que a Bíblia considera como o mais repugnante dos pecados, e nos tornamos idólatras e, ao mesmo tempo, nos identificamos com aquela escola materialista que está rapidamente se espalhando pelo mundo com o objetivo declarado de erradicar a própria ideia de Deus e de Alma.

Isso porque “Idolatria é Materialismo, o pecado comum e original dos homens, o qual substitui o Espírito pela Aparência, a Substância pela Ilusão, e conduz tanto o Ser moral quanto o Ser intelectual ao erro, de modo que eles substituem o superior pelo inferior, e o elevado pelo superficial. É esse falso fruto que atrai os sentidos externos, a tentação da serpente no começo do mundo”; e isso tanto para a raça quanto para cada indivíduo onde e quando quer que tenha vivido, pois todos estão sujeitos à sua atração.

Devemos então saber, para a reta compreensão das escrituras místicas, que em seu sentido esotérico, ou interior e real, elas não tratam de coisas materiais, mas de realidades espirituais; e que nem Adão é um homem real, porém antes denota a personalidade inferior ou força intelectual em todo ser humano; nem Eva uma mulher real, mas denota o elemento feminino em todo o ser humano, a saber, a Alma ou consciência moral; e ela é, portanto, chamada de a “Mãe dos que Vivem”, ou seja, dos que estão espiritualmente vivos – aqueles nos quais a Alma alcançou autoconsciência.

Tampouco o Éden é um lugar real, mas uma condição de inocência anterior a uma queda de uma altura alcançada. Nem é a Árvore da Vida no meio do Éden uma árvore real, porém Deus estabelecido no meio do Universo como sua vida. Do mesmo modo que não é o homem feito de imediato à imagem e semelhança de Deus, mas somente após longas eras de desenvolvimento, começando nas formas inferiores da vida vegetal, e seguindo sua elevação através de muitas formas, até que ele alcança a forma humana; e mesmo então ele não é feito à imagem de Deus, não é verdadeiramente homem no sentido bíblico e místico. Pois nesse sentido faz-se necessário algo mais do que o homem físico, mais do que o homem intelectual, mais até mesmo do que o homem moral, para tornar-se um homem.

Para ser feito à imagem e semelhança de Deus ele deve atingir sua maioridade espiritual, através do desenvolvimento da consciência de sua natureza espiritual. Ele deve ser alma tanto quanto corpo; Eva tanto quanto Adão; assim como no mundo físico, também no plano espiritual ele requer a mulher para lhe fazer um homem, e a mulher mística é a Alma. Antes do seu advento (da Alma), ele é o homem apenas materialístico e rudimentar, é homem apenas na forma, e é um animal em todos os outros aspectos.

Mas ela vem finalmente, manifestada como tão somente a Alma pode fazer, quando seu ser inferior está envolto em profundo sono, e ele acorda para descobrir-se plenamente homem, à imagem de Deus, macho e fêmea, no sentido que ele representa os dois aspectos, masculino e feminino da Deidade, o poder divino e o amor divino, e também os Sete Espíritos através dos quais Deus cria todas as coisas. Assim constituído ele é de fato Homem, pois ele é uma manifestação de Deus, por cujo espírito, operando dentro dele, ele tem sido criado. E criado desse modo tem sido e será todo o homem que jamais viveu ou viverá.” [Anna Kingsford e Edward Maitland. Addresses and Essays on Vegetarianism (Palestras e Ensaios sobre o Vegetarianismo), capítulo O Vegetarianismo e a Bíblia, pp. 216-218; grifos nossos]